BRASIL
- A tensão que marcou o fechamento do novo rombo nas contas públicas, anunciado na terça-feira,
não deixou dúvidas de que a disputa presidencial de 2018 ocupou lugar
privilegiado nas reuniões do governo.
Convencidos de que o ministro da Fazenda,
Henrique Meirelles, trabalha para ser candidato ao Palácio do Planalto, no ano
que vem, interlocutores do presidente
Michel Temer intensificaram a “fritura” do comandante da economia.
A
nova temporada do “fogo amigo” passa não apenas por gabinetes do Planalto como
pelo PMDB e PSDB, os dois principais partidos da coalizão. Filiado ao PSD – que
integra o bloco conhecido como Centrão –, Meirelles voltou à berlinda política
nos mais recentes capítulos da crise. Passou a fazer alianças estratégicas,
como a parceria com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), abriu em maio
uma conta no Twitter – hoje com 23 mil seguidores – e começou a participar de
eventos fora da agenda, como batizado de criança e até visita a igreja
evangélica.
Nos
bastidores, interlocutores de Temer acompanham com lupa os movimentos do
ministro e o nome dele aparece em pesquisas de intenção de voto encomendadas
por aliados, mas sempre com menos de 2%.
Embora
uma candidatura de Meirelles seja considerada improvável no atual cenário de
dificuldades, seus adversários lembram que em política as “nuvens” mudam muito
rápido. Com 2018 no horizonte, argumentam que ele pode ter apenas mais sete
meses e meio à frente da economia, se conseguir pôr de pé seu projeto
eleitoral, já que o prazo para a desincompatibilização de cargos públicos
termina em abril.
Os
últimos embates travados entre a equipe econômica, ministros políticos e
líderes do governo para a revisão das metas de déficit de 2017 e 2018 –
definidas em R$ 159 bilhões – irritaram Temer, que, a portas fechadas, pediu
“calma” à equipe.
Um exemplo das divergências ocorreu no dia 10, uma quinta-feira. Passava de 13h30 quando a temperatura esquentou no Planalto.
Depois
de ouvir a apresentação de Meirelles e do ministro do Planejamento, Dyogo
Oliveira, sobre o “pacote” do aperto para conter o rombo, o líder do governo na
Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), não se conteve. “Presidente, essa solução de
aumento de impostos não vai se concretizar. Não passa no Congresso”, disse ele,
dirigindo-se a Temer. “Ainda mais neste momento político, em que não se sabe se
vem mais flecha pela frente.”
Flecha
foi o termo usado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para se
referir às denúncias da Lava Jato encaminhadas por ele. A acusação por
corrupção passiva contra Temer foi rejeitada pela Câmara no dia 2 deste mês, mas
outras podem aparecer.
Naquela
reunião, o presidente concordou com Aguinaldo, mas cobrou uma alternativa. “Se
imposto não passa, como se faz?”, perguntou, sem esconder a contrariedade com o
vaivém dos números. Ao ver um ministro com olhar fixo no WhatsApp, interrompeu
a discussão e foi direto: “Vamos guardar o celular?”. Meirelles ensaiou ali o
primeiro recuo: “Eu senti essa dificuldade (para aprovação de impostos) na
última palestra que fiz. Mas precisamos buscar receitas e avançar nas
concessões”.
DESATINO
Cinco dias depois, poucas horas antes do anúncio de ampliação da meta fiscal, o senador Aécio Neves (MG), presidente licenciado do PSDB, foi ao Planalto pedir a Temer que não incluísse a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) no leilão para conter o rombo do governo. “Não podemos entregar a Cemig dessa forma por causa de um desatino do governo do PT”, provocou o tucano, alvo da Lava Jato, dando uma estocada em Meirelles.
Cinco dias depois, poucas horas antes do anúncio de ampliação da meta fiscal, o senador Aécio Neves (MG), presidente licenciado do PSDB, foi ao Planalto pedir a Temer que não incluísse a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) no leilão para conter o rombo do governo. “Não podemos entregar a Cemig dessa forma por causa de um desatino do governo do PT”, provocou o tucano, alvo da Lava Jato, dando uma estocada em Meirelles.
Mais
tarde, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), “furou” Meirelles,
anunciando aos jornalistas as metas de 2017 e 2018. Os críticos do ministro
observaram uma disputa de bastidores na equipe. “Eu não furei Meirelles coisa
nenhuma”, reagiu Jucá, esquivando-se das desavenças. “Falei com a imprensa às
19h15 e ele, às 19h30. Qual o problema? É tudo governo. E esse governo não faz
pedaladas, como o anterior. Não adianta maquiar os números. Está tudo
tranquilo.”
Ex-ministro
do Planejamento, atingido pela Lava Jato, Jucá sempre pregou uma meta de R$ 170
bilhões para 2017, considerada mais realista. Aliados aproveitaram a deixa e
entraram em uma queda de braço com Meirelles, na tentativa de ampliar as
despesas em um ano pré-eleitoral. O ministro perdeu a batalha pelo imposto, mas
não a guerra.
“A
meta fiscal foi ajustada porque o governo partiu de premissas que terminaram
não se confirmando. Foi otimista, mas não conservador o bastante”, afirmou
Jucá. “Acabou que a vida não deu ao Meirelles o que ele esperava”, disse o
líder da maioria na Câmara, deputado Lelo Coimbra (PMDB-ES).
Na
lista dos cálculos que não se confirmaram, o Planalto apontou a frustração de
receitas com a repatriação e o Refis – programa de refinanciamento de dívidas
de empresas com a Receita –, além do aumento do déficit da Previdência. O
argumento para o novo vermelho nas contas é o de que houve uma corrida para a
aposentadoria sem que o governo conseguisse aprovar a reforma.
Na
área econômica, porém, a avaliação é inversa. Com os principais indicadores
apontando para a retomada do crescimento e melhoria do emprego, Meirelles teria
virado alvo do fogo amigo de aliados. A possibilidade de um protagonismo maior
do ministro em um cenário econômico mais favorável começou a incomodar. Ainda
mais diante da queda da inflação para patamares abaixo de 3% abrir caminho, a
partir de agora, para o crescimento.
Após
vários embates, Temer pediu aos auxiliares que não estiquem mais a corda com
Meirelles. Questionado pelo Estado se repetiria a afirmação feita há
um ano, segundo a qual o titular da Fazenda estava sendo vítima de “manipulação
eleitoral”, o ministro da Secretaria-Geral, Moreira Franco, disse que não.
“Esta fase foi superada com sucesso por ele”, desconversou.
BATIZADO
Homem de mercado, amigo de empresários e banqueiros, Meirelles não tem desenvoltura política e sua “campanha” ainda é tímida. O ministro nunca fala em eleição nas reuniões econômicas, mas fora de Brasília veste um figurino de candidato. Na noite de 19 de junho, por exemplo, viajou até Belém para participar da comemoração dos 106 anos da igreja Assembleia de Deus. Foi homenageado com o “Tributo de Gratidão”.
BATIZADO
Homem de mercado, amigo de empresários e banqueiros, Meirelles não tem desenvoltura política e sua “campanha” ainda é tímida. O ministro nunca fala em eleição nas reuniões econômicas, mas fora de Brasília veste um figurino de candidato. Na noite de 19 de junho, por exemplo, viajou até Belém para participar da comemoração dos 106 anos da igreja Assembleia de Deus. Foi homenageado com o “Tributo de Gratidão”.
Meirelles
aproveitou que estava na capital paraense para participar do batizado da filha
do ministro da Integração, Helder Barbalho (PMDB), que se movimenta para
disputar o governo do Pará. A presença foi registrada pelo senador Jader
Barbalho, pai de Helder. Nenhum dos dois compromissos estava na agenda oficial.
A
aproximação entre Maia e Meirelles, na outra ponta, também é um jogo de
interesses. Os dois estreitaram relações somente após o agravamento da crise,
na esteira das delações da JBS. Interlocutores do deputado dizem que ele quer
ter o ministro como “âncora” da política econômica para o caso de algum dia vir
a assumir o comando do País. Maia é o primeiro na linha de sucessão da
Presidência da República.
Diante
de um quadro indefinido, há quem também observe um flerte de Meirelles com o
DEM. O partido de Maia está em busca de um candidato ao Planalto e já convidou
até mesmo o prefeito João Doria (PSDB) para ocupar o posto.
Comandado
pelo ministro de Ciências e Comunicações, Gilberto Kassab, o PSD está dividido
sobre o rumo a seguir em 2018, mas não parece empolgado com o lançamento de
Meirelles. “Ele está com muita vontade de ser candidato, mas precisa ter base
política”, resumiu o líder do PSD na Câmara, Marcos Montes (MG). “Só se
viabiliza se a economia deslanchar”, emendou o presidente do PP, senador Ciro
Nogueira (PI).
À
espera de se livrar das denúncias que o atingiram após as delações da JBS,
Temer quer inaugurar uma nova fase de seu mandato e planeja mostrar um “governo
de resultados” após outubro. O mês foi escolhido porque é o prazo estimado pelo
Planalto para aprovar a reforma da Previdência, hipótese vista como “irreal”
até por aliados. O governo avalia que até lá haverá diminuição do desemprego e
juros mais baixos, mesmo com os percalços na economia.
Ninguém
no PMDB, porém, aposta em Meirelles como uma opção de centro-direita para 2018.
Mesmo assim, quando questionado sobre previsões para a economia, Temer não
esconde a dependência do ministro da Fazenda. “Eu sou fraco em números. Fale
com o Meirelles.