BRASIL - Michel Temer confidenciou a aliados ter a
impressão de que já se passaram anos. Nos primeiros dias, governando sob
intensa pressão, demitiu dois ministros; enfrentou grampos com diálogos pouco
republicanos envolvendo a cúpula de seu partido, o PMDB; descumpriu promessas;
e enfrentou protestos que chegaram à porta de sua casa, em São Paulo.
Nesses 30 dias, o peemedebista buscou
administrar cobranças e, na maioria das vezes, teve que ceder pela percepção elementar
de que seu governo não é um governo de fato, mas interino. E, ironicamente,
apesar da pressão, a decisão no Planalto é seguir nessa toada. Ao menos até
agosto, quando ocorrerá no Senado o julgamento final do impeachment da
presidente afastada Dilma Rousseff, Temer decidiu entrar no jogo do Congresso e
engolir muitos sapos, construindo as alianças necessárias para garantir sua
permanência definitiva.
Com 59
votos contabilizados por sua
equipe a favor do impeachment de Dilma, apenas cinco a mais que os 54
necessários, o presidente interino tem se desdobrado em atenção aos senadores,
de quem tem ouvido centenas de pedidos. Quase todas as demandas, contam
auxiliares presidenciais, se resumem a cargos. Em seu gabinete, recebeu em
audiência oficial ao menos dez senadores. Nesta semana irá pela segunda vez ao
Congresso desde que assumiu a Presidência, agora para entregar o projeto que
estabelece teto para os gastos públicos. Um gesto de aproximação e de
cordialidade com deputados e senadores que na gestão Dilma reclamavam da falta
de atenção da presidente.
O governo acredita ter a situação sob
controle e publicamente nega que esteja agindo com vistas à votação do
impeachment. O ministro Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) nega que
Temer esteja sendo chantageado por senadores por conta da manutenção do voto
contra Dilma e garante não temer uma reviravolta no placar de votação.
— Não temos preocupação com isso — afirma
Geddel.
No entanto, desde que voltou ao Senado depois
da efêmera passagem pelo Ministério do Planejamento, Romero Jucá (PMDB-RR) tem
se dedicado prioritariamente à tarefa de garantir os votos que enterrem a
possibilidade de Dilma voltar ao Planalto. A propósito, a saída de Jucá do
governo foi considerada pelo presidente interino a situação politicamente mais
difícil que enfrentou até agora. Ele gostaria de mantê-lo pela lealdade que o
peemedebista teve desde o início do processo de impeachment e por considerá-lo altamente
capacitado para o cargo. No entanto, Temer percebeu logo nas primeiras horas
após a revelação das gravações das conversas entre Jucá e Sérgio Machado que
seria impossível suportar a pressão da opinião pública. Ao fim, Temer trabalhou
para minimizar os danos e mantê-lo como um importante aliado.
Acima inclusive das questões políticas, o
fato que mais tirou Temer do sério neste período foram os protestos em frente à
sua casa que deixaram a mulher, Marcela, e seu filho caçula, Michelzinho,
receosos de uma invasão. No dia em que anunciou suas primeiras medidas
econômicas, Temer fugiu ao seu tom discreto habitual, bateu com a mão na mesa e
disse que quando Secretário de Segurança de São Paulo “tratava com bandidos”,
em recado aos manifestantes.
Na Câmara, o presidente interino engoliu um
dos maiores sapos de seu primeiro mês, que foi aceitar a indicação imposta
pelos deputados do centrão de André Moura (PSC-SE) para líder do governo.
Absorveu as críticas de aliados do PSDB, DEM, PSB e PPS e da opinião pública
para evitar uma crise.
Apesar de ter colocado Moura na liderança a
pedido do centrão, o presidente interino continua sendo alvo de pressões do
grupo por mais cargos. Na semana passada, a fome pelo comando de órgãos
públicos quase paralisou a votação em segundo turno da DRU.
A rebelião foi contida antes de chegar ao
plenário pela promessa de Temer de que o assunto será resolvido. O presidente
explicou que seu governo é interino, mas que a partir de agosto, se o Senado
afastar permanentemente a presidente Dilma, as nomeações serão aceleradas.
Se por um lado a interinidade causa incômodo
aos novos inquilinos do Planalto, que operaram para acelerar o calendário da
Comissão do Impeachment no Senado, por outro, serve como uma boa desculpa para
Temer negociar com mais cuidado os espaços de cada aliado no poder. Apesar de
ter se apresentado antes mesmo da confirmação do afastamento de Dilma como
preparado para a função, Temer e sua equipe não contavam com os surpreendentes
desdobramentos da Lava-Jato e as cobranças de que tem sido alvo desde que
assumiu o poder.
— Ele reclama da cobrança. De fato, há uma
atmosfera mais pesada no Palácio do Planalto, mas não ficamos dando graças a
Deus a cada dia que passa como se estivéssemos numa luta pela sobrevivência —
diz um auxiliar.
Um assessor próximo de Temer admite que os
acontecimentos relacionados à Lava-Jato o obrigaram a adotar um comportamento
múltiplo, com os pés no Executivo, o olho no Legislativo e atento aos
movimentos do Judiciário. Além dos tiros fatais que atingiram dois de seus
ministros, Jucá e Fabiano Silveira (Transparência e Combate à Corrupção),
também pego em grampos, o afastamento do presidente da Câmara Eduardo Cunha
gerou uma situação de fragilidade no comando da Casa, por onde precisam passar
as matérias econômicas.
Pela situação atípica em que vive a Câmara,
com o presidente afastado e o interino, Waldir Maranhão (PP-MA), sem nenhum
respaldo dos parlamentares, o Planalto virou uma segunda casa da base aliada.
Rodrigo Rocha Loures, assessor especial de Temer, diz que Temer acredita que o
Congresso deva ser o protagonista da ação governamental.
Fonte: G1