BRASIL - Acusado de receber 2 milhões de
reais como propina e flagrado em diálogos não republicanos com
executivos da J&F que admitiram corromper políticos, entre eles o
presidente Michel Temer (PMDB), o parlamentar tucano tenta traçar duas
estratégias essenciais para si e para a própria família.
Nesta segunda-feira, Aécio, que por ter foro
privilegiado segue sua vida normalmente, passou boa parte do dia discutindo com
assessores os detalhes do discurso que deverá fazer entre terça e quarta. Autorizado
pelo ministro Marco Aurélio Mello a voltar a ocupar o cargo de senador por
Minas Gerais, ele deverá usar a tribuna para dizer que foi injustamente
envolvido em uma trama criada por Joesley Batista, o sócio da J&F (a
controladora da JBS).
O próprio senador admitiu que recebeu os 2 milhões de
reais de Joesley, mas diz que o valor foi um empréstimo para que ele pudesse
pagar seus advogados. E, certamente, os gastos com advogados tomarão boa parte
de seu patrimônio – estimado na eleição de 2014 em 2,5 milhões de reais.
Atualmente, o parlamentar responde a pelo menos sete inquéritos no Supremo
Tribunal Federal (STF). Vão desde a acusação de receber 30 milhões de reais da
Odebrecht, conforme delatores dessa empreiteira, até o de obstruir a justiça.
Depois de perder o segundo turno da eleição
de 2014 por uma estreita margem para Dilma Rousseff (PT), Aécio era tido como
nome certo do PSDB para eleição de 2018. Hoje não figura nem como o virtual
candidato do partido nas pesquisas dos mais diversos institutos que analisam a
opinião pública. Pessoas próxima a ele dizem que, antes da delação da JBS e já
envolvido na Lava Jato, ele pensava em concorrer ao cargo de deputado federal,
apenas para manter seu foro privilegiado e tentar ter alguma influência
política.
Contudo, o turbilhão dos últimos dias e as seguidas explicações que é
obrigado a dar por conta dos esquemas de corrupção o fizeram a repensar sua
carreira. Antes cercado de aliados, sua liderança dentro do PSDB e no Planalto
Central já passa a ser questionada.
Influência em queda
Assim que foi afastado das funções
parlamentares, Aécio licenciou-se da presidência do PSDB. Seu retorno ao cargo
ainda é incerto. As alas jovens e os neófitos na legenda, como o prefeito
paulistano João Dória, defendem sua saída definitiva da função do partido. E
mais, assumem que ele não tem mais respaldo para defender o apoio ao Governo Temer. Mas
seus antigos defensores ainda dizem que o senador merece mais um voto de
confiança. “Não vejo por que não poderia reassumir a presidência do PSDB. O
partido vai ser mais realista que o Judiciário, que lhe deu o direito à
dúvida?”, questionou o deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), um dos tucanos mais
próximos a Aécio.
Na visão de Pestana, o senador teve apenas
“um diálogo infeliz com o Joesley que estava treinado para criar arapucas”.
“Ele [Aécio], infelizmente teve o pior momento de sua trajetória política
naquele diálogo. Mas agora, o cenário está tudo muito embaralhado”.
Líder do Governo no Senado, Romero Jucá
(PMDB-RR), outro investigado no STF, diz que Aécio retornará ao Legislativo no
momento em que achar mais adequado e que a situação atual é de “normalidade”.
Jucá, no entanto, conta com o retorno do tucano para garantir que os demais
peessedebistas votem a favor da reforma trabalhista, que deve começar a ser
debatida e nesta semana e votada na próxima.
Para Ricardo Costa de Oliveira, professor de
sociologia política da Universidade Federal do Paraná, o retorno de Aécio ao
Senado é a continuidade da mesma composição que está no poder desde a queda de
Rousseff. “O Aécio é um símbolo dessa classe dominante tradicional. Indivíduos
desse estatuto geralmente gozam de grandes franquias e impunidade no Brasil”.
Além do campo jurídico, Aécio já terá de
resolver uma questão no curto prazo. A Comissão de Ética deverá analisar se
abre um processo contra ele por quebra de decoro parlamentar. Na primeira
tentativa de reabrir o caso, o processo foi enterrado com uma simples canetada do presidente do colegiado, João
Alberto Souza (PMDB-MA).
Ao engavetar a denúncia protocolada
pelo partido Rede Sustentabilidade, João Alberto seguiu um pedido do Governo
Temer. Cinco senadores recorreram da decisão e o presidente da comissão tirou
uma licença médica no mesmo dia que o recurso foi apresentado. Nos próximos
dias, o vice-presidente da comissão, Pedro Chaves (PSC-MS), um dos signatários
do recurso, deverá decidir se coloca em votação o pedido de reabertura do caso,
o que poderia gerar a cassação do mandato do tucano.