BRASÍLIA - O acordo de delação
premiada assinado pelo ex-ministro Antonio Palocci com a Polícia Federal,
revelado na quinta-feira (26), pelo O GLOBO, é uma reunião de fatos que
envolvem, em grande parte, o esquema de arrecadação do PT com empreiteiras citadas
na Lava-Jato e a atuação dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff nos crimes
apurados pela operação.
Por se tratar de uma colaboração negociada na primeira
instância, os temas abordados pelo ex-ministro dizem respeito a fatos
investigados — ou passíveis de investigação — pela 13ª Vara Federal de
Curitiba, comandada pelo juiz Sergio Moro, que terá o papel de homologar o
acordo.
Palocci está preso em
Curitiba desde setembro de 2016. Ele foi condenado por Moro a 12 anos, dois
meses e 20 dias de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de
dinheiro. Nas últimas semanas, além de fixar as bases dos benefícios concedidos
ao ex-ministro — ainda sob sigilo —, os investigadores concluíram a fase de
depoimentos. O acordo estaria na fase de homologação por Moro, o que deve
acontecer em até duas semanas.
O GLOBO apurou ontem que boa
parte das histórias abordadas por Palocci — que ainda poderão ser detalhadas no
curso das investigações — reconstitui o esquema de corrupção na Petrobras, as
relações das empreiteiras com políticos do PT e a forma como Lula e Dilma se
envolveram nas negociatas que resultaram em um prejuízo de cerca de R$ 42
bilhões aos cofres da estatal, segundo estimativa da própria PF. Durante o
processo de delação, Palocci também poderá apresentar anexos suplementares com
novos casos considerados relevantes pelos investigadores.
LULA E DILMA NEGAM ACUSAÇÕES
Ao falar de Lula, Palocci
detalhou ocasiões em que foi pessoalmente levar pacotes de dinheiro vivo ao
ex-presidente e relacionou datas e valores entregues por um de seus principais
assessores, Branislav Kontic, na sede do Instituto Lula. Segundo Palocci, os
pagamentos a Lula, feitos nos últimos meses de 2010, quando ele se preparava
para deixar o Planalto, chegavam a somar R$ 50 mil. Dinheiro que seria usado
pelo ex-presidente para bancar despesas pessoais.
Na ocasião das entregas,
relata o ex-ministro, ele e Lula combinavam o local de encontro para o
pagamento. Como o ex-ministro não dirigia o próprio carro, costumava levar um
auxiliar ao volante que agora, na delação, poderá ser chamado a testemunhar
sobre o caso. Além do assessor, cuja identidade é mantida em sigilo, Palocci
listou datas e horários das entregas de dinheiro a Lula como parte do conteúdo
probatório. A partir dessas informações, investigadores teriam condições de
atestar encontros, por meio de ligações telefônicas entre Lula e Palocci, e
pela posição dos aparelhos celulares no mapa de antenas.
Ao falar da relação de Lula
com empreiteiras, o ex-ministro disse que parte do dinheiro entregue nas mãos
do ex-presidente e na sede do instituto teria saído diretamente da “conta
Amigo”, a reserva de propina atribuída ao petista no Departamento de Operações
Estruturadas da Odebrecht. Já ao citar Dilma, Palocci afirmou aos
investigadores que ela teria atuado para atrapalhar as investigações da
Lava-Jato no episódio da nomeação de Lula para ministro da Casa Civil, em março
de 2016.
CONVERSA NO PLANALTO
O ex-ministro narrou ainda
pelo menos uma conversa com Lula no Palácio do Planalto na qual teria tratado
do esquema envolvendo a construção de sondas para exploração de petróleo em
águas profundas. O objetivo da negociação, feita na presença de Dilma, seria
levantar dinheiro para bancar a eleição da ex-presidente, em 2010.
Em nota divulgada ontem, Dilma
afirmou que “o ex-ministro mente para sair da cadeia e não tem provas para
sustentar acusações a ela ou Lula”.
Advogado de Lula, Cristiano
Zanin negou envolvimento de seu cliente nos fatos narrados:
— Qualquer afirmação de
entrega de dinheiro ao ex-presidente Lula é mentirosa e, por isso mesmo,
desacompanhada de qualquer prova. Lula jamais pediu ou recebeu vantagens
indevidas.
Em nota, o PT afirmou que
Palocci “rendeu-se às chantagens da Lava-Jato” e faz “falsas acusações” contra
Lula para receber benefícios.
Além de detalhar os casos de
corrupção dos quais participou ou teve conhecimento, o ex-ministro terá de
apresentar provas do que diz. Se mentir ou quebrar algumas das cláusulas
firmadas, poderá perder os benefícios negociados. Não está claro se Palocci irá
apresentar anexos tratando dos casos de corrupção envolvendo clientes de sua
consultoria, a Projeto. Também não há sinal de que ele irá citar casos que
estão fora da jurisdição de Moro, como o caso dos pagamentos de propina pela
J&F ao PT e fatos relacionados a antigas campanhas eleitorais do partido.
Fundador do PT, ex-prefeito
de Ribeirão Preto, ex-ministro da Fazenda do governo Lula e ex-chefe da Casa
Civil de Dilma, Palocci participou das decisões mais importantes do partido nas
últimas duas décadas. O PT sempre negou irregularidades nas doações de campanha
do partido.