BRASIL - Em encontro
com a elite dos industriais do Brasil em Brasília, dois dos protagonistas desta
eleição presidencial se depararam com tratamentos distintos.
Enquanto o
pré-candidato da direita Jair Bolsonaro (PSL)
foi aplaudido ao menos seis vezes ao dizer frases de efeitos - contra a
"ideologia de gênero" e contra o "politicamente correto",
que incluía a defesa de fazer piadas contra minorias sociais - e quase não
apresentou propostas detalhadas para o setor, Ciro Gomes (PDT)
acabou vaiado ao defender uma nova reforma trabalhista para substituir as
regras aprovadas sob Michel Temer. A
plateia era formada, em sua imensa maioria, por homens, de classe alta,
brancos. Quase 2.000 pessoas.
Líder nas pesquisas em
cenários sem o ex-presidente Luiz Inácio Lula
da Silva, que está preso, como concorrente do PT, Bolsonaro evitou o
tempo inteiro em entrar em temas econômicos. Disse ser "humilde" por
não entender do assunto e buscar o suporte de quem saiba. Por essa razão, não
respondeu diretamente a nenhuma das três perguntas feitas pelos empresários que
o assistiam durante evento promovido pela Confederação Nacional da Indústria
(CNI). Não aprofundou nem qual seria sua reforma da Previdência, que ele diz
ser necessária. “Talvez o Paulo Guedes fosse o mais preparado para responder”,
disse em dado momento do encontro. O economista Guedes é o consultor econômico
do parlamentar e seu eventual ministro da Fazenda.
Ainda assim, Bolsonaro
não precisou mais do que superficialidades para ser aplaudido. Uma das vezes
foi quando reforçou o seu discurso de que parte de seu primeiro escalão será
ocupado por militares. “Vou botar generais nos ministérios, sim. Qual o
problema? Os anteriores botavam terroristas e corruptos e ninguém falava nada”.
Em outro momento, foi quando defendia não levar ideologia para as negociações
com o Congresso.
“Não quero botar um busto do Che Guevara no
Palácio do Planalto”.
Também disse que contará com o apoio dos evangélicos, que
são contra a "ideologia de gênero", e atrairá a bancada ruralista ao
qualificar de "terrorista" o MST (Movimento dos Sem Terra). "Hoje
estão tirando nossa alegria de viver, não podemos mais contar piadas de
afrodescendentes, de cearenses, de goianos", disse Bolsonaro, que é réu no
Supremo Tribunal Federal por injúria e incitação ao racismo.
Ciro Gomes vaiado
Já o candidato Ciro
Gomes teve apupos a ele desferidos. Ocorreram no momento em que o pedetista
revelou que tem um acordo com as centrais sindicais que, se eleito presidente,
ele apresentará uma nova proposta de reforma trabalhista. O seu projeto seria discutido
com representantes dos patrões, empregados e de universidades. “Meu compromisso
com as centrais sindicais é trazer essa bola de volta ao meio de campo”. Após
ser vaiado, ele disse: “É assim que vai ser. Ponto final”. Mais vaias, que
provocaram uma nova reação do pré-candidato. “Se quiserem presidente fraco,
escolham um desses que ficam de conversa fiada aqui com vocês”.
O empresariado foi um
dos grandes fiadores da reforma trabalhista apresentada pelo Governo Michel Temer e
aprovada pelo Congresso Nacional no ano passado. Era natural que fosse
contrário a mudar a lei como foi promulgada. Ao ser questionado sobre o que
achou das vaias, Ciro disse que as via com maior naturalidade e lembrou que
também foi aplaudido. “Quando se é vaiado defendendo os trabalhadores, parece
que é um prêmio. E nem quero fazer disso um prêmio”, afirmou aos jornalistas ao
final do evento. De fato, em outras quatro ocasiões, Ciro acabou aplaudido –
entre elas quando defendeu que o Judiciário e o Ministério Público têm de
“voltarem para seus quadrados” e deixarem de influenciarem na política e quando
prometeu manter incentivos fiscais permanentes para o setor industrial.
Seja como for, o
pré-candidato do PDT foi o único dos seis que passaram pelo palco da CNI que
teve a reação negativa do público. O público se manifestou favoravelmente
também a Geraldo Alckmin (PSDB), que propôs a criação de um imposto único
(unificando IPI, ICMS, ISS e outros) além da redução do imposto de renda para
pessoa jurídica (citou a reforma tributária de Donald Trump como
exemplo), e para Álvaro Dias (PODE), quando ele citou que pretende intensificar
as relações multilaterais do país. Quando os oradores foram Marina Silva (REDE)
e Henrique Meirelles (MDB) quase nenhuma reação foi notada.
Algo que os seis
pré-candidatos tiveram em comum foi a de não se debruçarem sobre as propostas
apresentadas pela CNI. Antes de iniciar o diálogo com os pré-candidatos, a
entidade elaborou um documento com 43 propostas para os concorrentes. Tudo
citado muito brevemente por todos. Essa foi a segunda maratona de entrevistas
das quais os presidenciáveis participaram em Brasília. Ao longo desse mês,
todos deverão se dedicar às convenções partidárias, nas quais serão seladas as
alianças e coligações para a disputa ao Planalto.