As crianças nascidas
com microcefalia causada pelo vírus Zika poderão receber uma pensão mensal
pelo resto da vida. Esta medida está prevista em dois projetos de lei em
tramitação no Senado.
A concessão do
benefício para pessoas de famílias com renda inferior a quatro salários mínimos
consta do PLS
452/2017, de autoria do senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que está em
análise na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).
Na última sessão
deliberativa do Senado antes do recesso parlamentar, Lindbergh pediu urgência
para a votação do projeto no Plenário.
- As mães de crianças
com Zika têm uma verdadeira luta diária para fazerem fisioterapias, para
fazerem trabalhos de reabilitação. As pessoas geralmente têm que abandonar os
empregos. Eu queria pedir urgência, porque é um projeto em que o Estado
brasileiro é obrigado a pagar um salário mínimo a essas mães a título de reparação,
porque a Zika, na verdade, tem muito disto: de ausência do Estado, de falta de
saneamento básico. E eu sei que é importante a gente votar esse projeto no
próximo semestre - disse.
Famílias
Maria Helena Santos é
um dos bebês que nasceram em 2016 com microcefalia e problemas na visão. A
rotina da mãe, Thaise de Almeida Santos, de 30 anos, é levar a filha para
consultas médicas duas vezes por semana no Hospital de Apoio de Brasília. A
atenção integral à criança impede que ela arranje um emprego, pois todos os
dias são dedicados aos cuidados especiais.
- Eu me desesperei no
começo, porque é um baque. É estranho, muda tudo na vida. Eu tive que pesquisar
o que era microcefalia e entender que demora mais para o bebê se desenvolver.
Eles falam no hospital para a gente não deixar ela cair, mas também não deixar
num cantinho quieta, para brincar com ela e estimular a fazer as coisas -
relata Thaise.
A microcefalia é
identificada pelo tamanho da cabeça da criança, bem menor que o de outras da
mesma idade e sexo. Com menos espaço para o cérebro crescer, pode haver
consequências no desenvolvimento, como dificuldades na coordenação motora e
equilíbrio, atraso no crescimento, na linguagem e no aprendizado, epilepsia e
paralisia cerebral. A microcefalia não tem cura.
Saúde Pública
Lindbergh lembra na
justificativa do projeto que entre as causas da microcefalia está a infecção da
gestante pelo vírus Zika, transmitido pelo mosquito Aedes aegypti. O
senador argumenta que a erradicação do mosquito era tarefa do governo por conta
das consequências danosas à saúde pública, principalmente em razão da dengue.
O senador classificou a
proposta como uma “indenização parcial”, pois “é evidente que o ônus material e
espiritual que recai sobre as pessoas e as famílias não é passível de ser
devidamente indenizado por qualquer dinheiro no mundo”, observa.
Pensão
Pelo texto, o valor da
pensão será estipulado de acordo com indicadores da natureza e do grau da
dependência resultante da doença microcefálica e não será inferior a um salário
mínimo. Os critérios para classificação dos níveis da enfermidade serão
baseados em avaliações de incapacidade para o trabalho, para caminhar, para a
higiene pessoal e para a própria alimentação.
Para ter acesso ao
benefício a pessoa diagnosticada com microcefalia ou seu responsável deverá
apresentar um requerimento de pensão ao Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS) acompanhado de um atestado médico comprobatório das condições do
paciente, emitido pelo próprio INSS. O Instituto se responsabilizará pelo processamento,
a manutenção e o pagamento da pensão.
O recebimento da
indenização, de acordo com a proposta, não prejudicará outros benefícios de
natureza previdenciária ou assistencial. Além disso, é vedada qualquer redução
por conta de acúmulos de outros benefícios.
A matéria tem voto
favorável da relatora na CAE, senadora Lídice da Mata (PSB-BA), que destacou o
baixo impacto financeiro-orçamentário do projeto para as contas públicas;
levando-se em conta que são em torno de 3 mil crianças com microcefalia em
decorrência da infecção da mães, o gasto anual seria de R$ 54 milhões.
Alterações
Lídice apresentou duas
emendas, uma delas para garantir que a pensão especial seja recebida pela
pessoa responsável pela guarda do menor para facilitar a operacionalização do
pagamento e também para aumentar o limite de renda familiar de quatro para
cinco salários mínimos mensais sem que isso venha a incorrer em aumento dos
custos do programa.
“Ao mesmo tempo, seriam
incorporadas famílias que estão acometidas pelo mesmo flagelo da dor de ter um
ente querido com microcefalia e cujo padrão de renda pouco difere daquele das
famílias ora contempladas, sobretudo aquelas com renda próxima do teto”,
justifica Lídice.
A outra mudança é para
esclarecer os critérios de diferenciação dos valores para a pensão especial que
levem em conta as variadas condições de dependência e de incapacidade do
beneficiário. Os valores seriam estipulados de acordo com cada caso, tendo como
limite inferior o salário mínimo e como limite superior o valor do teto do
benefício previdenciário.
A senadora ainda sugere
que em caso de morte da pessoa com microcefalia, seja garantida ao responsável
uma pensão mínima vitalícia equivalente a 50% do valor da pensão especial, não
podendo, entretanto, ser inferior ao salário mínimo.
Após ser avaliada pela
CAE, a matéria também será analisada na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), que
terá a decisão final.
Outro projeto
Também garante pensão
vitalícia para pessoas diagnosticadas com microcefalia causada pelo vírus Zika o PLS
255/2016, do senador Eduardo Amorim (PSDB-SE). A matéria já foi aprovada na
CAS e aguarda na CAE o relatório da senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM).
Para o autor, como a
doença tem consequências graves e permanentes, a iniciativa busca minimizar o
sofrimento e reforçar o orçamento das famílias.
— Diante da gravidade
da situação e dos enormes prejuízos físicos e emocionais causados nas crianças
microcéfalas e em seus familiares, julgamos que o poder público deve assumir
sua parte da responsabilidade e, além de lhes prestar assistência à saúde e educação
integral, garantir-lhes o pagamento de benefício mensal e vitalício, com o
intuito de custear parte dos enormes gastos necessários para propiciar vida
digna a esses indivíduos — explica Amorim.
Zika
De novembro de 2015 a
maio de 2018 o Ministério da Saúde notificou 16.028 casos de malformações
resultantes do Zika vírus, com confirmação de 3.124 casos. No mesmo período,
também foram confirmadas 327 mortes de bebês relacionadas com o vírus.
Os dados, no entanto,
apontam para uma redução significativa dos casos de microcefalia registrados no
Brasil. A situação mais alarmante foi em 2015, com a confirmação de 1.161
casos. Já em 2016, esse número caiu para 857 casos. Atualmente, o número de
casos de microcefalia voltou aos patamares residuais de ocorrência.
Laboratórios do Brasil
e de outros países das três Américas estão cada vez mais perto da vacina contra
a infecção provocada pelo vírus Zika. Testes já foram realizados com sucesso em
animais e agora a vacina está sendo testada em humanos que começaram a produzir
os primeiros anticorpos. A eficiência da imunização deve ser confirmada nos
próximos dois anos.
Agência Senado