BRASIL - O Senado aprovou por 59 votos a 21 na
madrugada desta quarta-feira (10), após quase 15 horas de sessão, o relatório
da Comissão Especial do Impeachment que recomenda que a presidente afastada
Dilma Rousseff seja levada a julgamento pela Casa.
Com
isso, ela passa à condição de ré no processo, segundo informou a assessoria do
Supremo Tribunal Federal (STF). O julgamento final da presidente afastada está previsto para o fim do mês no plenário do Senado.
Antes da votação do texto principal, os
senadores já tinham rejeitado, também por 59 votos a 21, as chamadas
"preliminares" que questionavam o mérito da denúncia contra Dilma.
Depois do texto principal, houve a votação de três destaques (propostas de
alteração do texto principal), apresentados por senadores defensores de Dilma
com o objetivo de restringir os delitos atribuídos a ela. Todos os destaques
foram rejeitados.
ISENÇÃO - Embora estivesse presente ao plenário, o
único dos 81 senadores que não votou foi o presidente da Casa, Renan Calheiros
(PMDB-AL). Ele afirmou que tomou essa decisão para se manter isento.
"Procurei conduzir com isenção. Desconstruir essa isenção agora não é
coerente", explicou.
COMANDADA
PELO presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, a sessão teve início às 9h44 desta
terça-feira (9) e terminou às 2h38 desta quarta (10).
A previsão inicial era a de que duraria pelo
menos 20 horas e o relatório só fosse votado de madrugada. No entanto, a sessão
foi encurtada depois de vários senadores inscritos, principalmente de PSDB e
PMDB, abrirem mão dos dez minutos que cada um teria direito para discursar.
Após a votação, o ex-ministro José Eduardo
Cardozo, responsável pela defesa de Dilma, disse acreditar que ainda é possível
reverter o resultado no julgamento final do impeachment, embora reconheça que
não “é uma situação fácil” para a presidente afastada.
“Tanto do ponto de vista jurídico quanto
político esse resultado não necessariamente expressa o resultado final. Na
pronúncia, nós sabemos que aqueles que estão em dúvida devem votar contra o
acusado. Mas, no julgamento final, quem está em dúvida deve votar a favor do
réu, é o 'in dubio pro réu'. Então, esse resultado não vincula o julgamento
final”, disse Cardozo.
"Não
é uma situação fácil, mas não creio que é um resultado que não possa ser
revertido”, completou o ex-advogado-geral da União.
Cardozo afirmou ainda que poderá questionar,
no Supremo Tribunal Federal, procedimentos das sessões de votação do
impeachment que, na visão dele, prejudicaram o direito de defesa de Dilma e que
poderiam gerar "nulidade".
“Eu posso apresentar [recurso] a qualquer
momento. Mas vou avaliar em qual momento. Posso apresentar agora ou depois.
Cada dia com sua agonia. Mas é uma estratégia que pode ser exitosa",
concluiu.
O
PARECER, elaborado pelo senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) e aprovado na Comissão do
Impeachment, acolhe partes da acusação de crime de responsabilidade contra a
petista. A denúncia é de autoria dos juristas Miguel Reale Júnior, Janaína Paschoal e Hélio Bicudo.
O TEXTO
DIZ QUE DILMA ROUSSEFF COMETEU “atentado à Constituição” ao praticar as chamadas
“pedaladas fiscais” – atraso de pagamentos da União a bancos públicos para
execução de despesas.
Segundo Anastasia, as “pedaladas” configuram
empréstimos da União com bancos que controla, o que é proibido pela Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF).
O parlamentar também afirma, no parecer, que
Dilma desrespeitou o Legislativo ao editar três decretos de crédito suplementar
sem autorização do Congresso Nacional.
Ainda de acordo com o tucano, as práticas do
governo Dilma Rousseff, ao editar decretos e praticar “pedaladas fiscais”,
estão associadas à “profunda” crise econômica pela qual o país passa
atualmente.
Os atos, segundo Anastasia, levam a
comunidade internacional a acreditar que o Brasil “não é um país comprometido”
com a ordem financeira.
PRÓ E
CONTRA - Antes da votação do
relatório de Anastasia, foram escalados para discursar da tribuna dois
senadores contrários e dois favoráveis ao parecer.
Primeiro a falar, o senador Humberto Costa (PT-PE) afirmou que a
coleta de provas e oitiva de testemunhas pela comissão de impeachment não
demonstraram cometimento de crime de responsabilidade.
“Em nenhum momento, nem o senador Anastasia,
nem nenhuma das testemunhas que lá compareceram, nem os senadores que lá
estiveram conseguiram comprovar a existência de crime de responsabilidade
praticado pela presidente da República”, disse o petista.
Em seguida, o líder do PSDB, senador Cássio
Cunha Lima (PSDB-PB), sustentou que as chamadas “pedaladas fiscais” no governo
Dilma foram a “maior fraude da história”.
“O relatório do senador Anastasia é um
relatório irrefutável e irrespondível. O Senado fará
justiça, respeitará a Constituição e votará ‘sim’ pelo afastamento de Dilma
Rousseff”, discursou.
O senador Jorge Viana (PT-AC) também criticou
o parecer aprovado na comissão e questionou a isenção de Anastasia para ser o
relator do processo.
“Esse é um processo viciado. Tem um vício de
origem porque foi arquitetado pelo senhor Eduardo Cunha [ex-presidente da
Câmara] e tem um vício aqui no Senado. Sinceramente, eu não acreditava que o
PSDB fosse assumir essa relatoria. É beneficiário dele, como o PMDB”,
argumentou.
O petista ponderou ainda que a atual fase não
é definitiva. “Tem vários colegas que dizem que vão votar para que o julgamento
siga em frente, mas só vão dar a sua posição definitiva no fim desse processo”,
afirmou.
Favorável ao relatório, a senadora Simone
Tebet (PMDB-MS) classificou o parecer como “irretocável” e “demolidor”.
“O parecer é irretocável, quer nos argumentos
jurídicos defendendo item por item e contraditando todos os itens a começar
pelas preliminares, como é demolidor no argumento político”, sustentou.
TENTATIVA
DE SUSPENSÃO - Logo no
início da sessão, senadores aliados de Dilma Rousseff chegaram a apresentar um
pedido para suspender a votação do processo, mas que acabou rejeitado pelo
presidente do Supremo, que considerou que o motivo das solicitações era
“estranho” ao processo de impeachment.
Depois das questões de ordem, Anastasia fez
um resumo do seu parecer por 30 minutos. Ele voltou a afirmar que Dilma cometeu
crime e, por isso, deveria ser julgada.
Depois disso, os senadores usaram a tribuna
para discursar a favor e contra o relatório – 29 falaram a favor e 18 contra.
Após a discussão, acusação e defesa fizeram suas últimas manifestações sobre
a fase intermediária do impeachment.
'PRELIMINARES' - Antes da votação do texto principal, foram
analisado as chamadas "preliminares" apresentadas por aliados de
Dilma Rousseff, que questionavam se o Senado poderia votar o mérito da denúncia
contra a presidente.
Um dos argumentos era que, como as contas de
2015 do governo Dilma ainda não foram analisadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pelo Congresso, o
Senado não teria condições de se pronunciar sobre isso.
Aliados da petista também questionavam nas
preliminares o fato de o relator do parecer pertencer ao PSDB, partido
adversário do PT.
O terceiro ponto é um aspecto mais técnico e
sustenta que o artigo da chamada Lei do Impeachment, de 1950, que trata das
“pedaladas fiscais”, não foi acolhido pela atual Constituição e, portanto, não
teria validade para ser usado no parecer.
As preliminares acabaram rejeitadas, o que
abriu caminho para a votação do texto principal.
PRÓXIMOS
PASSOS - Com a conclusão da
votação do relatório, após a análise dos destaques, o processo irá a julgamento
final no plenário do Senado no fim do mês.
A acusação recebeu prazo de até 48 horas após
a sessão encerrada na madrugada desta quarta-feira para apresentar uma peça,
chamada no jargão jurídica de “libelo acusatório”.
Esse documento nada mais é do que uma
consolidação das acusações e provas produzidas. Eles também deverão apresentar
um rol de testemunhas a serem ouvidas.
Um dos autores da denúncia, o jurista Miguel
Reale Júnior, já comunicou ao Senado que entregará o libelo acusatório em 24
horas e que deve apresentar uma lista só com três testemunhas das seis a que
tem direito.
Em seguida, a defesa terá 48 horas para
apresentar uma resposta, a contrariedade ao libelo, e também uma lista de seis
testemunhas. José Eduardo Cardozo, advogado de Dilma, já disse que usará
todo o prazo a que tem direito.
Todos os documentos são encaminhados para o
presidente do Supremo, a quem caberá marcar uma data para o julgamento e
intimar as partes e as testemunhas. Deverá ser respeitado um prazo de dez dias
para se marcar o julgamento.
Assim, Lewandowski já teria condições de
marcar uma sessão de julgamento para o dia 25 de agosto. Mas ainda há uma
indefinição com relação à data.
Uma das possibilidades é que o presidente do
STF marque o julgamento para o dia 29, com uma semana de duração. Aliados
do presidente em exercício, Michel Temer, no entanto, pressionam para que o início do
julgamento seja antecipado.
Fonte: G1